O projeto da Marx-Engels-Gesamtausgabe (MEGA)
A edição das obras completas de Marx e Engels teve seu início nos anos 1970, em Berlim e em Moscou. Desde então, obteve sempre grande prestígio por parte dos grupos de especialistas e atualmente pode ser encontrada em todas as grandes bibliotecas do mundo. A partir de 1989, a continuidade da publicação passou a contar com o apoio de cientistas, políticos e editores de vários países europeus, do Japão e dos Estados Unidos.
Em 1990, por iniciativa do Instituto Internacional de História Social, que conserva a maior parte dos manuscritos de Marx e Engels, foi fundada em Amsterdã a Fundação Internacional Marx-Engels (Internationale Marx-Engels-Stiftung / IMES), que, desde então, edita a MEGA como publicação de caráter acadêmico e resultado de uma cooperação científica internacional. O IMES, politicamente independente, é uma rede internacional da qual fazem parte a Academia de Ciências de Berlim-Brandenburgo, o Instituto de História Social, em Amsterdã, o Instituto de Pesquisa Histórica da Fundação Friedrich Ebert, em Bonn, e o Arquivo Público da Rússia para a História Social e Política, em Moscou. O IMES tem como objetivo concluir o projeto da MEGA, a edição histórico-crítica dos escritos completos de Marx e Engels.
O conjunto da MEGA foi reduzido de 164 para 114 volumes, dos quais 52 foram publicados. Atualmente, trabalham neste projeto equipes de pesquisadores na Alemanha, Rússia, França, Holanda, Dinamarca, Itália, Estados Unidos e Japão, o que torna a MEGA o mais importante projeto internacional deste tipo, recebendo apoio inclusive da União Européia.
Com a mudança da editora Karl Dietz Verlag para a editora Akademie Verlag e a publicação dos primeiros volumes, já de acordo com novos critérios editoriais, foi concluída a reorganização do projeto. No “Frankfurter Allgemeine Zeitung”, Ulrich Raulff comentou os longos esforços para a retomada da edição e lembrou os princípios que a norteiam: “Despolitização, internacionalização e academicismo eram os três propósitos ligados ao prosseguimento do trabalho na MEGA. O primeiro propósito era atingido com o abandono da editora Dietz Verlag: a filologia estava protegida de seu último veneno, o sectarismo partidário. A realização do terceiro propósito estava garantida pela passagem da edição às mãos da editora Akademie Verlag. Nela os volumes azuis figuram, agora, ao lado das grandes edições de Aristóteles, Leibniz, Wieland, Forster e Aby Warburg – clássicos em meio aos clássicos”. (“Frankfurter Allgemeine Zeitung”, 7 de outubro, 1998).
Atualmente, na Academia de Ciências de Berlim-Brandenburgo, oito colaboradores científicos preparam doze volumes e se encarregam da redação final e da revisão técnica de todos os volumes editados em cooperação internacional.
Os doze volumes publicados após a reorganização da edição, sob os cuidados da Akademie Verlag, obtiveram uma extraordinária repercussão no público alemão e internacional, para-além dos círculos especializados. A eles foram dedicados comentários detalhados na “Frankfurter Allgemeine Zeitung”, no grande jornal japonês “Asashi Shimbun”, no “Times” de Londres e no “Journal of Commerce”, de Washington. No mesmo sentido, o “Die Zeit” (25 de fevereiro, 1999) caracterizou a continuidade da Edição Completa das Obras de Marx e Engels como um ato necessário de justiça histórica: “A MEGA é, no sentido próprio da palavra, um empreendimento secular e seu começo, seus obstáculos e ressurgimento refletem de modo paradigmático as tragédias históricas do século XX. No ano de 2025, quando, de acordo com o plano editorial, ela estiver concluída, terá sido necessário exatamente um século para que a obra de Marx e Engels pudesse ter vindo à público em sua forma original, isto é, não censurada”.
Sobre a História da MEGA
O projeto de uma edição completa, histórico-crítica, das obras de Marx e Engels, remonta a David Rjazanov (1870-1938). Nos anos 1920, em Moscou, o estudioso russo deu início a uma edição das obras de Marx e Engels em 42 volumes, editados em Frankfurt e em Berlim e dos quais apareceram doze volumes entre 1927 e 1941. A tomada do poder por Hitler e a escalada do terror stalinista nos anos 1930, do qual Rjazanov e muitos outros editores russos e alemães foram vítimas, colocaram um fim a esta edição, que, pela primeira vez, trouxe a público os “Manuscritos Econômico-Filosóficos” de 1844 e a “Ideologia Alemã”. Embora o projeto de Rjazanov tenha sido retomado em Moscou e em Berlim à época do “degelo” que se seguiu à morte de Stalin, a concepção de uma nova “segunda” MEGA, que apresentasse os legados literários de Marx e Engels integralmente e conforme com o original, dotada de um comentário minucioso e que traçasse a evolução dos textos à luz de métodos modernos, só pôde impor-se nos anos 1960, contra a resistência das altas instâncias partidárias, que viam com suspeita uma edição completa, histórico-crítica. À época, o Instituto Internacional de História Social (IISG) apoiou prontamente o projeto, uma vez garantido o caráter completo e histórico-crítico da edição. Os critérios editoriais desta “nova” MEGA, apresentados em 1972 em um volume de prova, baseavam-se em concepções editoriais inovadoras e foram favoravelmente acolhidas pelos especialistas internacionais. Dois terços dos manuscritos originais indispensáveis para uma edição histórico-crítica encontram-se desde os anos 1930 aos cuidados da IISG, o outro terço restante encontra-se em Moscou e, atualmente, é conservado pelo Arquivo Público da Rússia para a história social e política. Dos 36 volumes surgidos até 1990, uma terça parte foi preparada pelo Instituto de Marxismo-Leninismo integrado ao CC do PCUS, em Moscou, outra terça parte pelo Instituto de Marxismo-Leninismo integrado ao CC do SED, em Berlim, e a última parte pela Academia de Ciências e outras universidades e escolas superiores da RDA (Berlim, Erfurt-Mühlhausen, Halle-Wittenberg, Iena e Leipzig).
Após o outono de 1989, a IISG e a Casa Karl Marx (Tréveris) da Fundação Friedrich Ebert, em acordo com as editoras então filiadas ao projeto, tomaram a iniciativa de criar uma Fundação Internacional Marx-Engels (IMES), que foi instalada em Amsterdã, em outubro de 1990.
Em fevereiro de 1992, a Conferência das Academias de Ciências Alemãs firmou um contrato de cooperação com a Fundação Internacional Marx-Engels. Sob recomendação do Conselho Científico e da Comissão Federal para a Planejamento do Ensino e do Incentivo à Pesquisa, a MEGA, após uma avaliação positiva por uma comissão internacional presidida pelo filósofo Dieter Henrich, foi integrada ao Programa Acadêmico da Federação e dos Estados a título de Projeto da Academia de Ciências de Berlim-Brandenburgo. A “avaliação deste projeto editorial [teve] por resultado a constatação de seu alto nível e sua correspondência aos padrões de exigência do Ocidente” (Henrich 1993, p. 20).
Isto vale, igualmente, para o aspecto físico dos volumes da MEGA – concebidos pelo artista gráfico Abert Kapr, de Leipzig – cuja tipografia e encadernação foram mantidas após a passagem da editora Dietz Verlag para a Akademie Verlag (1998).
Constitui uma novidade, ao contrário, a despolitização da edição, particularmente de seus comentários. O antigo imperativo de edição e interpretação teleológicas, politicamente motivadas, cedeu lugar ao princípio de uma conseqüente avaliação da historicidade da obra. Trata-se de uma contextualização do pensamento marxiano, capaz de situá-lo em seu tempo, com seus problemas e interrogações.
Fica, assim, evidente que Marx, independentemente da força de um pensamento que marcou a história, ocupa um lugar na história de várias disciplinas cientificas: com a MEGA, acentua-se o caráter enciclopédico de uma obra que se estende, para-além das ciências econômicas e sociais, até a filosofia, a sociologia e a história da cultura.
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